História da Companhia de Artilharia 1688 na Guiné Bissau entre 1967 e 1969

terça-feira, abril 17, 2007


O PESADELO DA CONSCIÊNCIA

Aquando da Guerra Colonial, o palco do teatro de guerra estava praticamente restrito a Angola, Moçambique e Guiné. Para ali convergiram as armas e bagagens da juventude portuguesa, para ali convergiram todos os dinheiros públicos e não só dum pequeno País europeu.

O curioso é que o meio rural deste nosso Portugal municiou toda a carne para canhão. Os senhores do outro regime continuavam a procurar que a luta fosse em prol de um Portugal uno e indivisível.

A consciência de alguns militares de carreira, feridos nas suas susceptibilidades de acesso, vendo-se ultrapassados por milicianos, dada a falta de mão-de-obra capaz, procurou uma saída airosa, estando tal comportamento por trás do movimento dos capitães de Abril. Durante 13 anos passaram milhares de soldados pela guerra nos mais variados cenários. E custa-me ver que ainda somos apelidados, conotados, com o anterior regime, quando não tínhamos condições de fugir ao cumprimento de um dever patriótico. Errado ou não, era o dever que se sobrepunha a todas as situações.

Os mais audaciosos, principalmente das classes rurais, fugiam à guerra, não porque estivessem politizados, mas com o medo estampado no rosto, iam a salto para França, Luxemburgo e mais tarde para a Suíça e Alemanha.

Os meninos-bem, quase de sangue azul, desertavam, com muito mais medo que os pobres do interior deste nosso Portugal. São esses que mais tarde voltaram arvorados em heróis antifascistas e que foram ocupar as cadeiras do poder, nas mais variadas situações.

Outros ainda, filhos de colaboradores directos do antigo regime, apressaram-se a inscrever-se nos partidos recém criados, para assegurarem o seu futuro. Conheço tantos.
Finalmente, aqueles que por falta de meios financeiros para uma fuga para os países da Europa, ou do Norte de África, combateram e deram o corpo em nome do País que os viu nascer. Como eu, tenho a certeza de que muitos milhares de portugueses ainda têm muito orgulho em terem combatido em nome de Portugal, e disso não nos poderemos envergonhar.

Mas, todo este meu reparo é para tentar compreender a posição actual, em comparação com o cumprimento de missões de Paz, de meia dúzia de meses, com contactos diários com os familiares, psicólogos, internet, etc., etc.

Fiquei passado quando li há dias num jornal diário que um determinado sargento após 4 meses no Afeganistão vai ter de se adaptar à família, sem o receio em cada esquina. E nós, ao fim de 24 e mais meses, quando regressávamos o que encontrávamos?

O stress de guerra do tempo colonial, não tem comparação com o stress das actuais missões.
Cada vez mais, sinto que no presente, ser ainda um antigo combatente é um peso para os governantes, pois não somos considerados nem ex-combatentes, nem sofredores de síndromes de guerra. Enfim, não somos nada.

Acabei de ver que o Senhor Presidente da Republica vai receber os últimos soldados a chegar da Bósnia. E a nós, quem nos esperava? Só se lembram de nós (antigos combatentes da guerra colonial) quando é para pedir votos para os tachos daqueles que traíram, fugiram, desertaram e voltaram para ocupar o lugar dos pais e avós com outras designações políticas.

Este meu desabafo, foi feito no dia em que um antigo paraquedista, com o apoio, creio eu, da Liga dos Combatentes, foi a Guilage (Guiné) resgatar o corpo de 3 camaradas que ali ficaram e que o nosso Exército, e os sucessivos governos não tiveram a coragem de resgatar. (Foto de Manuel Almeida/Lusa)

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