História da Companhia de Artilharia 1688 na Guiné Bissau entre 1967 e 1969

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

O DIA A DIA EM ENCHEIA


O 3º Grupo de Combate passou a ocupar o pequeno aquartelamento de Encheia a partir de 5 de Junho de 1967; O primeiro dia foi passado a contabilizar os prejuízos da viagem.
Como o Grupo de Combate era composto por três secções, praticamente as emboscadas eram processadas a uma secção ou a duas, pois tinha que ficar alguém no Aquartelamento.
O Aquartelamento era composto por um quadrado de cerca de 100 metros por 100, com duas entradas: uma do lado do Rio Mansoa, que distava cerca de 1000 metros, e outra na mesma direcção, no sentido da rua principal e única de Encheia, onde existiam meia dúzia de casas de adobe, das quais três eram comerciais, e que servia também de pista de aviação.
Dentro do arame farpado existia a casa do chefe de Posto, modelo idêntico em quase toda a Guiné, uma antiga casa que serviu de Posto Médico, e que era usada pelos quadros (Alferes
Jesus, Sargento Vieira, Furrieis Rogério, Nóbrega e Neto.
As entradas eram fechadas com cavalos de frisa.
Do lado do rio existia um armazém de cereais, desactivado e que era ocupado por alguns soldados. Do lado de Encheia existia uma caserna de adobes, que num dos lados dispunha de
enfermaria e de uma pequena arrecadação de géneros.
Junto ao edificio dos quadros, havia um pequeno abrigo de bidons e areia, onde se situava o sistema de transmissões.
Do lado de trás da casa dos quadros, existia um pequeno abrigo para a fossa do morteiro (secção do Neto); por trás da casa do chefe de Posto, situavam-se antigas instalações de galinhas porcos e outros animais, que estavam a ser utilizadas pelos soldados.
O arame farpado que cercava o aquartelamento passava muitio perto destas instalações.
Junto ao cavalo de frisa do lado de Encheia, existia um pequeno abrigo semi enterrado coberto por cibos e areia, (que segundo os Leões Negros, em 1970, desabou corcumido pelas formigas baga baga).
Do lado oeste existiam palhotas, onde habitavam alguns nativos que colaboravam com a tropa
bem como as familias dos cipaios.
Não existia luz eléctrica a qual só foi inaugurada em 10 de Junho. O gerador ficou instalado em
abrigo junto à porta de entrada do lado de Encheia.
As três casas comerciais pertenciam uma ao velho libanês Naim, outra a um nativo, de que não me lembro o nome, outra ao Fontaínhas (creio que da Casa Gouveia) que ardeu (fogo posto) na noite de 18 de Agosto daquele ano de 1967; recordo-me que precavendo qualquer tentativa de ataque, optámos por fazer uma psico (?) que fosse ao encontro dos desejos e necessidades da população; Assim, o Grupo de Combate que rendemos deixou uma pequena arrecadação com os medicamentos a granel sem qualquer ordem.
Eu, juntamente com o enfermeiro, optámos por montar os medicamentos que lá se encontravam mais os que levámos, numa espécie de farmácia ou posto de pronto socorros.
Fizémos constar que atenderiamos os elementos nativos que necessitassem de ajuda e assim nasceu um apoio tipo consulta. Diariamente atendiamos cerca de uma dezena de necessitados.
A uns, eram feridas resultantes de quedas ou de cortes, outros, eram dores abdominais, etc etc. Sem sermos médicos procurávamos deixar boa impressão aqueles que se nos dirigiam.
Foi assim que uma parturiente teve de ser evacuada a nosso pedido, por helicóptero tendo
tido um filho já no hospital em Bissau. Passados alguns dias, regressou com o filho nos braços juntamente com os fuzileiros. Perguntando-lhe como se chamava o minino, disse que se chamava Helicóptero.
Doutra vez, andava eu, aflito com uma infecção num dente, com a cara inchada e como não encontrasse melhor medicamento, pedi ao enfermeiro que me desse uma injecção de um determinado medicamento; ao que ele me respondeu, que nunca tinha dado uma injecção.
Nesse dia, todos os nativos que recorreram ao posto médico levaram injecção dadas pelo enfermeiro e à noite ele deu-me a desejada injecção que me curou o abcesso
Como procurámos não incomodar, normalmente uma das secções, se dirigia ou à Fonte recolher água ou ia à lenha para nosso uso (cozedura do pão e para a cozinha); de vez em quando montávamos uma emboscada, ou iamos adquirir à força gado para nossa alimentação (vacas, galinhas, porcos).
Cumpriamos o ciclo de emboscadas que nos mandavam efectuar em apoio a operações desencadeadas pelas Companhias de Binar Biambi e também esporadicamente de Bissorã.
Como não tivessemos um esquema montado de controlo das sentinelas, tinhamos sempre diariamente uns petiscos (normalmente rolas fritas, omeletes ou outros petiscos) que comiamos por volta da meia noite, Antes das duas da manhã, normalmente passávamos uma ronda, e por essa hora deitavamo-nos.
Certo dia, (na madrugada de 26 de Julho de 1967) bateram-nos à porta da casa que habitávamos; ensonado, esfregando os olhos, de cuecas, abro a porta e qual não é o meu espanto, deparo com um grupo infindável de militares armados, que eu mal conheci, e só quando o nosso Capitão pediu para falar com o Alferes eu prontamente fui ao quarto do Alferes Jesus, chamando-o, dizendo-lhe que o Capitão estava lá fora.
Acontece que a Companhia entrou por ali dentro e não vislumbrou qualquer sentinela. O Capitão passou um raspanete ao Alferes que só visto.
A partir daquela data, peguei nas minhas coisas e fui para o abrigo da minha secção, junto ao gerador da electricidade.
Muitas outras estórias há para contar de Encheia. Ficará lá mais para a frente.

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quarta-feira, fevereiro 07, 2007

O 3º GRUPO DE COMBATE RUMOU A ENCHEIA


No dia 4 de Junho de 1967, o 3º Grupo de Combate, saíu em viaturas com destino a João Landim, onde embarcámos numa LDM com destino a Encheia.
A LDM ia sobrecarregada, pois além do pessoal referente ao Grupo de Combate e suas respectivas bagagens, trasportávamos uma viatura Unimog, pelo que a Porta da LDM ia semi fechada. A viagem decorreu de noite, sem qualquer anormalidade, até cerca das 21 H3o a menos de mais hora de Encheia houve necessidade de encostar à margem pois a LDM estava a meter àgua pela porta levadiça.
Encontrava-me a dormitar no bojo da LDM, junto ao Unimog, deitado sobre dois bancos de madeira, quando senti que a àgua estava já com abundância dentro da LDM. Imediatamente
me coloquei em pé e verifiquei que a àgua já me dava pelos joelhos.
Gritei pelos fuzileiros a quem lhes comuniquei o ocorrido. Imediatamente colocaram a bomba a trabalhar, para se proceder ao escoamento da àgua. A mesma não respondeu de imediato pelo que se temeu o pior, Lá estivémos a acalmar o pessoal, espalhado pela LDM pois alguns já estavam a querer saltar para a àgua. Evitou-se o pior.
Os fuzileiros lá conseguiram colocar a bomba a trabalhara e a àgua lá se escuou.
.Entretanto as bagagens pessoais como vinham no porão ficaram inutilizadas danificadas e algumas perdidas definitivamente. Também material de guerra se perdeu definitivamente
No cais de Encheia aguardavam-nos o pessoal que restava do Pelotão que íamos render.
Nós a desembarcar e eles a meterem atarefadamente os seus haveres, precipitando-se numa fuga de Encheia pois nem sequer cohabitaram connosco até ao dia seguinte. Meterem-se na LDM e de madrugada lá rumaram a joão Landim.
O pequeno aquartelamento deEncheia não oferecia qualquer segurança; não havia electricidade
o arame farpado estava mesmo junto de pseudos abrigos . O velhos entretanto para espevitarem os piriquitos, fizeram algumas rajadas de G3 e claro os nossos soldados não responderam mas procuraram o abrigo mais próximo. Pela minha parte, formei um voo e entrei pelo abrigo ( o tal que mais tarde arriou sózinho) tendo batido com a cabeça no cibo da entrada tendo feito um enorme galo na testa.
Na manhã do dia seguinte partimos à descoberta de Encheia, medrosos, pois sabìamos que o pelotão rendido havia sofrido um ataque à cerca de mês e meio, que provocou a morte de 5 soldados e vários feridos. Por conseguinte Encheia passou a ser para nós um lugar mítico, mas que com o decorrer do tempo soubémos conquistar.
As primeiras semanas em Encheia foi de conhecimento geográfico, montámos algumas emboscadas, noturnas e diurnas, fizémos alguns patrulhamentos e como existia população civil em redor de Encheia procurámos estabelecer uma relação de convívio normal, sem tentar impor uma autoridade, que não a tinhamos mas que os nativos respeitavam .
A existência de um chefe de Posto e alguns cipaios, também permitiu que o nosso relacionamento fosse normal
De qcordo com uma táctica escolhida pelos graduados Alferes Jesus, Sargento Vieira, e furrieis
Rogério, Neto e Nóbrega, passámos a tratar o chefe de Posto com alguma deferência, mas sempre de pé atrás porque não nos merecia à partida toda a confiança, e simultâneamente, procurávamos informações junto de cipaios, do velho Naim, ou ainda do Danif quando lá se encontrava. (Estes dois ultimos eram comerciamtes locais- O Velho Libañês Naim, tinha negócio por conta própria; o Danif representava a Casa Gouveia.
Sobre Encheia voltaremos mais adiante com novas

P O E S I A NO CANO DA ARMA

Nem só com a arma se construia uma nova Guiné.
Quando o Pelotão se encontrava de segurança à Fonte, junto da bolanha grande na estrada para Binar, havia dias que a nostalgia invadia nossos corações e com a arma junto às nossas pernas, sentados junto de uma àrvore, escreviamoso que nos vinha à ideia. Havia quem aproveitasse para escrever uma pequena carta para a namorada, para a madrinha de guerra, para a esposa familiares ou amigos.
Num daqueles dias, em que tal aconteceu ser invadido por uma vontade extrema de escrever qualquer coisa, lembrei-me de dedicar ao nosso soldado uma pequena poesia, como agredecimento por tudo quanto, naqueleas horas ele dava de si a todos nós.
E o poema nasceu:


S E N T I N E L A OU P L A N T Ã O


Olhos fixos na noite escura,
Rostos cansados
Das vigílias!
Sentinelas das nossas vidas
Que vedes, que vigias?

Arma pendente,
rente ao capim,
Arame em volta,
Que me envolve a mim .

Montros, formas gigantes.
Palmares e imbondeiros.
Sentinela!
Estãs à alerta?
Vês esses olhos matreiros?

Horas pedidas,
Noites vencidas,
Ouvidos atentos,
Em tudo o que vem.
Sentinelas das nossas vidas
Vigias como nossa Mãe.

Vento agreste,
Chuva penetrante
Tudo suportas
Com resignação.
Sentinela!
A nossa vida
Na tua mão.

E quando inimigo
penetra na noite
Se aventurando
Com alguma descarga.
Tu gritas:
-SAÍDA !
Formas um salto,
Defendes tua e nossa vida.

A manhã vem alta
Dum azul resplandecente:
Tua vigia é necessária.
Tu respondes Presente.

E o rosto cansado
Das constantes vigílias
A que não podes dizer não,
Ainda és tu que velas por nós,
Altaneiro e firme no Posto,
SENTINELA OU PLANTÃO.

terça-feira, fevereiro 06, 2007

BAPTISMO DE FOGO DO 3º PELOTÃO DA C.ART 1688


Era uma hora e trinta minutos da manhã do dia 18 de Maio daquele ano de 1967, quando nos levantámos da cama, tomámos o pequeno almoço e após os ùltimos preparativos, largámos em viaturas militares, devidamente escoltados, pelas três horas rumámos a João Landim..
Ali chegados, embarcámos em LDM dos Fuzileiros e lá fomos Rio Mansoa fora em direcção ao interior, mais pròpriamente para lá de Encheia.
Eram três pelotões reforçados; o nosso (piriquito) e dois pelotões da C Caç. 1496.
A viagem durou cerca de 4 horas, tendo alguns de nós aproveitado para dormitar.
Pelas 7 horas e 20 minutos, alcançámos Envcheia e passados cerca de 15 a 20 minutos, ancorámos em local prèviamente escolhido pelas chefias.
Logo após o desembarque, organizámos a coluna; à frente seguiam os dois grupos de combate da Companhia de Caçadores 1496,; na cauda seguia o nosso grupo.
Atravessámos uma bolanha, ultrapassános uma tabanca (conjunto de várias palhotas) cujos olhares da população não nos mereciam a mínima confiança. Passámos ainda por uma outra bolanha, outra tabanca ainda e eis-nos num terreno, pouco arborizado em àrvores de grande porte, mas com bastantes arbustos pequenos. Ao fundo, avistou-se uma mata mais cerrada a cerca de uns 600 metros
De repente, à esquerda e longe, ouve-se um tiro e o estrondo de uma bazucada.
Olhei para trás e disse ao Furriel Neto, que estava próximo - para ali a coisa já começou.
Mal tinha acabado de falar e dado meia dúzia de passos , ouve-se à nossa frente e da mata um tiro seguido de uma rajada
Imediatamente os nossos soldados se atiraram para o chão e cada qual procurou o melhor abrigo. Encontrei-me atrás sw um pequeno arbusto e arrisquei correndo para trãs de uma pequena àrvore, aparentemente oferecendo melhor abrigo.
O potencial de fogo era mais sobre a nossa direita, mas mesmo assim o condutor da minha secção, abrigado à minha direita, sentiu e eu próprio testemunhei os efeitos de uma bala ao cravar-se no solo alguns metros à nossa frente.
Ouvia-se com bastante intensidade o silvo de balas a atravessar o ar.
Naqueles momentos de aflição, tudo nos ocorre e mentiria aquele que dissesse que nunca sentiu receio ou medo nestas circunstâncias.
A seguir ao tiroteio, efectuou-se a batida. De seguida, novamente em coluna, passou-se a incendiar todas as palhotas que se encontraram abandonadas de pessoal nativo. Foram todo cerca de 1oo palhotas.
Fiquei verdadeiramente abismado, quando verifiquei que os "velhos" passaram a retirar das palhotas objectos para uso pessoal, tais como roupas, catanas, pequenos utensílios, galimhas, cabritos e muitas outras coisas.
Isto passou-se em Late nas franjas do Queré.
Por volta das 14 horas e debaixo fr um sol infernal alcançámos o Rio Mansoa onde as LDMs nos esperavam para o regresso a João Landim e consequemtemente, a Bula.
Este nosso patrulhamento pelo lado do Rio Mansoa, inseriu-se numa operação mais alargada
que incluiu A C Art 1525 a 1 grupo de Combate, Os Falcões de Bissorã, 1 Grupo de Milicias, Policia Administrativa de Bissorã e C Caç 1612 a 2 grupos de Combate.
Pelo nosso lado a operação designou-se BRIGÃO pelo outro lado (Bissorã) foi desiganada por
BATE QUE BATE.
O comportamento dos velhos contagiou alguns maçaricos do nosso pelotão e recordo-me de ver o sargento Vieira, que também participou nesta operação, arrastar um vitelo, desde as palhotas de Late, até muito próximo do rio. Como estava exausto, devido à caminhada, ao esforço, ao calor e à sua idade, e porque tinha que se esforçar ainda por subir um pequeno morro, acabou por desistir e soltar o vitelo. Mal sabia ele que ultrapassado o morro, esperavam-nos os fuzileiros a escassas dezenas de metros.
Chegámos a Bula pelas 20 horas.